quinta-feira, 21 de novembro de 2013

A incapacidade tropológica

Quando as palavras me eivam, gosto de cerrar os olhos e deixar que o desafio onírico me guie e alimente a alma. Um homem não se faz apenas e só de palavras, de semântica ou preposições – a gramática torna-se inepta. Deixemos de lado a oniromancia, que isso não é nada mais que um mero charlatanismo, intelectualmente desonesto, e sem qualquer sustento verosímil. Nesta quimera é impossível congregar os dois mundos.
       Não há espaço para a apofântica, para a hiperonímia, para a hiponímia ou para a antonímia. Nem há espaço para a holonímia, nem para a meronímia. É desprovido de qualquer sentido linguístico. Neste desafio não se transcreve ou parafraseia – pode ser bom para o exercício intelectual, mas nunca poderá ser holográfico – e, por isso, não se partilha. Pelo menos, não na sua totalidade nem na sua graciosidade. Não se consegue.
Definir qualquer enlevo é limitar o que não tem limite; é alienar o que não é alienável; é palpar o que não é palpável. Deve-se muito menos encará-lo como um paradoxo de Schrödinger e, sim, encará-lo como deve ser: o nosso bem mais precioso. Portanto, usemo-lo e desafiemo-lo. 

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

A fragância sincopal


Tudo se desconcerta, quando se entontece para o embalo do turbilhão
Que nos faz cair sem tropeçar.
Tudo tem um passado, que deixa marca quando as cicatrizes se curam
E o apetite apenas serve para relembrar.
Tudo tem um veneno que fervilha sem que as águas se agitem
Onde os pensamentos morrem sem sarar.
Tal como a quebra da onda nada altera
Apenas tudo embala para se definhar.  

domingo, 6 de outubro de 2013

Vertigo

O pão que o Diabo amassou
Nem o Judas salvou.
A batalha que Ulisses liderou
Nem Protesilau poupou.
A invocação que Camões declamou
Nem D. Sebastião regressou.

São os sinais da desintegração
Conseguimos senti-los, mesmo sem coração.
 

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

O Ósculo

Tudo parou. Os carros, as pessoas, o tempo. Nada mais fez sentido e tudo foi esquecido.
Naquele momento só os dois corpos existiam – o mundo pertencia-lhes a eles e só a eles. Com fervor, olharam-se nos olhos e não resistiram – era como se o centro da gravidade estivesse no espaço vazio entre eles, e os atraía louca e apaixonadamente sem qualquer resistência ou impedimento. Tudo parou para assistir àquele momento fantástico e divinal. Os lábios, carnudos e sedentos um do outro, tocaram-se de uma forma nunca antes vista e sentida. Beijaram-se. A adrenalina disparou e sentia-se a milhas de distância as batidas dos dois corações – que agora eram apenas um e só um, como sempre foram. Batiam em uníssono, com afecto e paixão. Era, ao mesmo tempo, um som animalesco, carnal e lascivo, mas também carinhoso e cheio de sentimento. Os corpos, entesados e ardentes, estavam colados um ao outro, bem apertados pelos braços que faziam questão de se entrelaçarem e pelas mãos quem percorriam cada centímetro de pele. Sentia-se a fricção e os tremores sensuais dos corpos mergulhados no prazer carnal, misturado com saudade e desejo.
     Naquele momento divinal e único, as sensações conseguiam ser vistas, cheiradas e sentidas – eram policromáticas como se os corpos tivessem LSD no seu sistema e a banda sonora daquele beijo fossem os Pink Floyd. O ósculo catapultou-os para um outro estado e dimensão. Ela, humedecida de prazer, trincava-lhe o lábio inferior, ele, completamente entesado, tocava-lhe nos seios perfeitos e firmes e ambos desejosos de, em movimentos cadenciados, ser apenas um, como sempre foram. 

quinta-feira, 11 de julho de 2013

A Entropia - Uma visão racionalista

Irei, por agora, abandonar o meu vocabulário usual, optando por um tom vernaculista, pois, por vezes, um foda-se é bem mais eficaz que qualquer outro termo ou expressão. E é o que isto é: um foda-se!
Desengane-se aquele que pensa que isto é um grito de revolta ou algo do género. Não o é. É, sim, o constatar de um facto: mais cedo ou mais tarde, a entropia instala-se, seja qual for o sistema, organização ou conjunto; seja qual for o método, modo ou forma. Mesmo que todas as variáveis sejam controladas, basta um merdoso deslize para que a filha da puta da entropia se instale.
Quando a entropia se instala, todos acham-se no direito de falar e opinar. Nestes opinadores, que são sempre um terceiro partido, temos de tudo: os inúteis, aqueles que não têm caralho de coisa alguma para acrescentar mas querem participar na mesma; os oportunistas, aqueles que tentam, com a entropia alheia, conquistar ou beneficiar com esse estado; os frustrados, aqueles que como não sabem ou conseguem lidar com a sua própria entropia, opinam sobre a entropia alheia como se fosse a sua; e os falsos, aqueles que, como um camaleão, se vão camuflando de acordo com os seus interesses. Calma que nem tudo aqui é mau. Ainda bem, ou estávamos todos fodidos como se estivéssemos numa arena romana.
Temos também os que realmente se interessam, no bom sentido, pela entropia alheia: os curiosos, aqueles que apenas querem compreender melhor todo este processo; os inquietados, aqueles que querem realmente ajudar a reestabelecer a sinergia perdida; e os prevenidos, aqueles que actuam antes da entropia, por forma a evitá-la.
A pergunta que paira no ar, quase que aposto, é: que caralho se está aqui a dizer? Pois bem, cada agente deve resolver a equação entrópica por si, recorrendo às suas qualidades e virtudes, com as suas aptidões, pensamentos e sentimentos. Porque no fim, são esses mesmos agentes que irão viver ou em entropia ou em sinergia. Os opinadores, bom, esses vão apenas assistir ao longe, sem sentir grande coisa. E lá porque a entropia se instala, não quererá dizer que o sistema, organização, conjunto, método, modo ou forma não seja reestabelecido correctamente.
         Não é assim tão difícil de se entender, foda-se!

terça-feira, 2 de julho de 2013

O Manifesto do Corpo e da Alma

Nem sempre a mente executa como o coração manda. Por vezes, a cerração apodera-se do corpo sem pedir consentimento e arrasta-o, lenta e ruinosamente, para a treva – o quase-abismo. O abismo, esse, pode ser interminável, como um buraco negro que suga tudo à sua volta, mas pode ser apenas uma contrariedade, um óbice imprevisto – um obstáculo dos deuses, se o quisermos colocar de uma forma mais esotérica.
Dois desfechos são possíveis:
É interminável, quando nos fechamos nesse ciclo sem a autoconsciência que o abismo está ali, fixo e pronto a devorar cada pedaço da nossa consciência e humanidade.
A tomada de consciência, quando se forma, é o passo inicial para a luz, para o término desse momento negro – é fulcral para que o corpo volte a resplandecer e se torne humano novamente, voltando a obedecer repetidamente ao coração. Este é um processo que requer uma grandiosa força, vontade e conhecimento. Conquanto, este processo não pode ser todo ele feito sozinho e sem ajuda, antes pelo contrário. As mãos dadas são a alavanca para a elevação das almas. Para a purificação e para a confiança. Para a felicidade e para o amor. 

terça-feira, 25 de junho de 2013

Corpos Trauteados: O Perfume


Embebido no meu coração estará para sempre o teu perfume: doce; sensível; contagiante e sensual.
Sinto-o como o sangue que percorre o meu corpo
E cheiro-o a cada batida do meu coração.
Jamais saíra do meu corpo.
Quero-o como um pianista anseia pela sua obra-prima.
É o compasso que fica apenas composto com o teu toque, o teu beijo e o teu sorriso.
Juntemos os nossos perfumes para que o elixir perfeito seja criado.

Encontrado está: continuemos a misturá-lo.